Depois de A Bússola Dourada quis ver um filme que não me desiludisse, e aproveitei o facto de não estar exactamente de bom humor (sim, que há certas coisas que não se conseguem fazer tão bem de espírito limpo), e fui ver o filme de David Cronenberg Eastern Promises - traduzido para um indiferente e banal Promessas Perigosas. Não conheço todos os filmes de Cronenberg, mas os que conheço (sobretudo os mais antigos) nunca me desiludiram. Também confesso que a dupla Viggo Mortensen e Naomi Watts não foi indiferente ao apelo que o filme exercia sobre mim.
O filme é tido como um thriller, mas confesso que nunca tive dúvidas nem senti grande suspense, não tanto sobre o desenrolar do enredo nas suas nuances, mas quanto à progressão narrativa e ao padrão dessa progressão, por isso a tensão era razoavelmente constante e o suspense foi substituído pelo incómodo constante, pela violência, por aquilo que nós, espectadores, sabemos que está mal, e nem sequer no final do filme esse sentimento é aliviado. O filme não terá um clímax no sentido clássico de atingir o pico de tensão e de posteriormente a resolver preparando o final, porque a tensão é permanente, com momentos mais ou menos em que a violência, mais do que o suspense é sua catalisadora. A cena mais violenta, e magistralmente feita, filmada e coreografada em que o actor se expõe sem limites numa entrega à câmara de filmar muito pouco comum, dura, segundo dizem, 4 minutos - para mim foi uma eternidade, e eu creio que não consegui ver nem metade: fechei os olhos e depois tapei os ouvidos pois mesmo sem ver, o som era de um grafismo demasiado evidente e arrepiante. Cronenberg é um realizador que põe sempre em evidência, trabalhando e olhando de formas diferentes, a fisicalidade e a plasticidade dos corpos, e no que eles têm de específico e diferente e este filme não é excepção. Viggo Mortensen é simplesmente fabuloso em todos os aspectos: desde o penteado até à forma como apaga o cigarro. Naomi Watts de uma forma menos óbvia mostra também como é uma grande actriz na sua personagem determinada mas frágil, que quer o fazer o que está certo, mas que não é totalmente inocente. Vincent Cassel é também um actor convincente numa história que nunca faz concessões ao fácil ou ao óbvio. Apesar de ter fechado os olhos algumas vezes, senti-me vingada da chatice que foi ter visto dois dias antes um filme enfeitado mas vazio, e foi um prazer ver um bom.