“… he resolved never again to kiss earth for any god or man. This decision, however, made a hole in him, a vacancy…” Salman Rushdie in Midnight’s Children.
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12.8.09

Leitura de Verão


Mão amiga fez-me chegar, via Amazon, este simpático livro que olha para o cérebro feminino e mostra o quão diferente ele é do masculino. Nada que nós mulheres, que o somos porque temos um corpo de mulher, ao longo dos tempos não tivéssemos vindo a perceber. Mas até esta intuição, que não precisou de grandes estudos científicos, este gut feeling é explicado,

Gut feelings are not just free-floating emotional states but actual physical sensations that convey meaning to certain areas in the brain. (…). The areas of the brain that track gut feelings are larger and more sensitive in the female brain, according to brain scan studies. Therefore the relationship between a woman’s gut feelings and her intuitive hunches is grounded in biology. (Segue-se uma descrição científica sobre os circuitos e a química cerebrais que me abstenho de transcrever).

Assim, e de uma vez por todas, arrumamos com o feminismo dominante dos anos 70 que pretendia unisexizar tudo e incutir às mulheres a ideia de que elas eram iguais aos homens, incitando-as a fazerem o que os homens faziam segundo as regras por eles estabelecidas ao longo de milénios. Nunca conseguiram estabelecer a diferença entre igualdade tout court e igualdade de oportunidades e direitos. Foi pena. Perdeu-se muito tempo e a sociedade não ficou melhor por isso.

The biological reality, however, is that there is no unisex brain. The fear of discrimination based on differences runs deep, and for many years assumptions about sex differences went scientifically unexamined for fear that women wouldn’t be able to claim equality with men. But pretending that women and men are the same , while doing a disservice to both men and women, ultimately hurts women. (…) Assuming the male norm also means undervaluing the powerful, sex-specific strengths and talents of the female brain.

Estes livros científicos pensados para o grande público e convertidos em best-sellers, feito em que os norte-americanos são exímios, conseguem ser boa leitura. Porque sérios e credíveis para percebermos que não lidamos com videntes, curiosos ou gurus espirituais de uma qualquer escola de auto-ajuda, e porque permitem uma leitura apelativa. A obra é pensada para o leitor: desde a estrutura do livro aos exemplos dados, tudo se lê facilmente, com interesse e bem. Há momentos especialmente engraçados (o capítulo sobre a adolescência é uma mina deles) e o capítulo “The Mature Female Brain” é particularmente interessante. Podem-se, nestes capítulos ler coisas como:

Every brain begins as a female brain (...) it only becomes male eight weeks after conception when excess testosterone shrinks the communication centre, reduces the hearing cortex and makes the part of the brain that processes sex twice as large.

Ou

Connecting through talking activates the pleasure centers in a girl’s brain. Sharing secrets that have romantic and sexual implications activates those centers even more. We’re not talking about a small amount of pleasure. This is huge. It’s a major dopamine and oxytocin rush, which is the biggest, fattest neurological reward you can get outside an orgasm. (…) It keeps them motivated to seek these intimate connections. What they don’t know is that this is their own special girl reality. Most boys don’t share this intense desire for verbal connection. (…) Girls who expect their boyfriends to chat with them the way their girlfriends do are in for a big surprise. (…)The testicular surges of testosterone marinate the boys’ brains. Testosterone has been shown to decrease talking (…). In fact, sexual pursuit and body parts become pretty much obsessions.

Ou

A menopausal woman becomes less worried in pleasing others and now wants to please herself. This change (…) is triggered by a new biological reality based in the female brain as it makes it’s last big hormonal change of life. (…) She’s less interested in the nuances of emotions; she is less concerned about keeping the peace; and she is getting less of a dopamine rush from the things she did before, even talking with her friends.

Estes são alguns excertos, uma pequeníssima amostra deste livro interessante sério e de fácil leitura. Registo, no entanto, as sempre presentes intenções pedagógicas e a pontinha moralista tão características destas obras norte-americanas. Mais uma tentativa – entre tantas já feitas ao longo dos séculos (a psicanálise, por exemplo a que tantas mulheres recorreram sabe Deus porquê) com ou sem base sólida científica - de melhorar o relacionamento entre homens e mulheres (em saudável monogamia, claro) através do conhecimento científico e aprofundado do cérebro feminino e das suas diferenças biológicas e químicas em relação ao cérebro masculino. Este conhecimento permitiria quer à mulher quer ao homem, uma maior compreensão do cérebro feminino ao longo dos anos que deveria ser usado para melhorar os relacionamentos. Talvez assim, homens e mulheres juntos, consigam finalmente, mais depressa e melhor serem felizes para sempre. Nunca se sabe...
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21.11.07

Os Livros Errados

Seja para onde for que eu vá levo sempre um livro comigo. A ideia de ter que esperar e ficar a olhar para o nada, ou ter que ler revistas já demasiado lidas, remexidas e desactualizadas, ou de ter que fazer de conta que não olho para ninguém, mesmo depois de ter contado os botões do casaco da senhora do lado esquerdo e de ter fixado o padrão da gravata do senhor em frente, é demasiado incómoda, muito mais do que carregar com um livro. Como não tenho paciência para os forrar (e para quê, se não os sujo?) quem estiver perto de mim pode sempre saber o que leio. Nunca ninguém se impressionou com o que leio, nunca fui abordada por causa do livro em mãos e nunca ele foi ponto de partida para inesperadas, interessantes e profundas conversas, nem para descobertas de almas gémeas que de outra forma andariam perdidas, ou de grandes e inevitáveis amores, nem tão pouco de mais prosaicas e sólidas amizades. Ler e ter um livro na mão tem sido ao longo dos anos algo de solitário e mesmo privado e que nunca despertou a curiosidade de ninguém. Lembro-me apenas de uma vez, numa consulta médica ter sido simpaticamente interpelada pelo médico que viu o livro e autor, lembro a ocasião, mas não lembro nem o autor nem o título da obra. Seria cortesia seria genuino não sei. Também me lembro de, por duas vezes creio, ao verem um livro nas minhas mãos me perguntarem se tinha lido o Código da Vinci. Não, esse não li, dizia eu terminando assim de forma demasiado abrupta a conversa como se fosse pecado não o ter lido, como se, pelo mero facto de ter um livro na mão, se pudesse inferir que teria lido o Código da Vinci.

Esta semana tudo mudou. Comecei a ler o último romance de Miguel Sousa Tavares, Rio das Flores, e mais uma vez carrego o livro comigo, que é grande e pesado. E no espaço de seis dias já fui abordada três vezes em situações e locais bem distintos, uma vez por uma pessoa desconhecida e as outras duas por pessoas que mal conheço. Todas queriam saber se estava a gostar, e se falava muito do Brasil. Ando espantada com tanto interesse pela obra de Miguel Sousa Tavares. Ou então sou eu que, nas outras ocasiões, leio os livros errados...

12.9.07

A Espuma dos Dias que foram 5

Nunca um verão foi para mim tão mau de leituras como este. Ao contrário do habitual, muni-me de romances recentes, comprados de propósito para serem lidos logo, quase todos num impulso guiado por uma vontade de ler boas histórias (algumas na História) descomplicadas, que me prendessem e que não exigissem muita concentração. Capas luminosas e apelativas e que tivessem para cima de duzentas páginas. Ao contrário de alguma tendência que vejo nas livrarias, provavelmente ditadas por interesses comerciais, que normalizaram o romance de cento e poucas páginas, eu gosto de livros grandes ou de romances que se declinam em vários livros grandes (Guerra e Paz nunca me assustou, bem pelo contrário) e de pensar que me vão embalar por uns tempos. Talvez porque prefira continuar a ler do que começar a ler. As primeiras páginas de um romance são sempre as mais difíceis, e acabar um livro de que se gosta revela-se sempre uma perda, uma espécie de luto. Comprar livros para os ler logo de seguida não é um gesto habitual em mim, embora às vezes aconteça. Compro-os normalmente porque gosto, para os ter, um dia, lê-los ei. Gosto de os deixar passear pela casa, numa espécie de estágio a fazerem-se desejados (“apprivoiser”, parece ser uma boa palavra) antes de os colocar na estante. Este verão nada disso aconteceu, sem me dar conta alterei os rituais e o olhar sobre os livros na livraria, dos quatro que comprei só acabei um,


Barrie Sherwood
Escape From Amsterdam

outra coisa rara pois mesmo quando o romance não me agrada totalmente tento lê-lo até ao fim. O que acabei não me agradou especialmente, mas talvez fosse o único com uma escrita de alguma qualidade, algum humor e originalidade, mas nem por isso o recomendo. Para atenuar a frustração peguei nuns volumes antigos das aventuras de Hercule Poirot, pois Agatha Christie é sempre um valor seguro, e diverti-me a reler histórias que já nem lembrava.

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