“… he resolved never again to kiss earth for any god or man. This decision, however, made a hole in him, a vacancy…” Salman Rushdie in Midnight’s Children.
holehorror.at.gmail.com

30.3.10

Charles De Gaulle

Tejo
(Vale a pena clicar para aumentar)

Em trinta segundos, o tempo de uma busca no Google francês pois vi que o porta-aviões tinha bandeira francesa, fiquei a saber tratar-se do porta-aviões nuclear Charles de Gaulle que ficará por cá (na foz do Tejo) até sexta-feira. Mais um porta-aviões que fotografo.


29.3.10

Olha que chatice... Queriam fotos, sorrisos, conversa de chacha e beijinhos, não era?

28.3.10

Coisas que se podem Fazer ao Domingo 48

Auguste Rodin (1840-1917)
Study for the Naked Balzac


Onde estava eu com a cabeça?

O PSD de Pedro Passos Coelho Não Faz a Diferença

Pedro Passos Coelho ganhou de forma inequívoca a corrida a líder do PSD. Os militantes do PSD não deixaram dúvidas sobre quem preferiram. Alguns dentro do partido farão as suas leituras e encontrarão as devidas explicações. Duvido, no entanto, que esta vitória corresponda ao desejo daquela que é a maioria do eleitorado tradicional do PSD e que não vê uma diferença substancial e clara entre José Sócrates e Pedro Passos Coelho. Fica a sensação de que a vontade dos militantes não é a vontade daqueles que, não sendo filiados em partido algum, constituem o eleitorado tradicional e mais ou menos fixo do PSD, e fica a sensação de que os militantes do PSD se fecharam no partido em vez de se abrirem para o país. Será interessante verificar se estou ou não certa, mas este possível desfasamento deveria ser motivo de atenção (e eventualmente preocupação) para PPC .

A maioria do eleitorado PSD, está farto de José Sócrates, dos seus equívocos, inverdades, conhecimentos informais, curriculum, da sua falta de consistência, dos seus anúncios de medidas bandeira do optimismo, do seu marketing político, das suas frases feitas. A maioria do eleitorado do PSD não gosta do “socialismo”, seja ele ideológico ou só nominal, histórico ou Terceira Via, genuíno ou "caviar", e quer uma alternativa política não socialista e credível para o desenvolvimento - eu sei que esta palavra está carregada de “optimismo” e talvez fosse mais realista falar em “evitar o colapso” – do país. A maioria do eleitorado do PSD sabe que isso só se faz com reformas estruturais e, ao contrário do eleitorado socialista, deseja, quer, anseia por essas reformas. Os socialistas evitam-nas e não querem nem sabem fazê-las. Como será, na prática Pedro Passos Coelho diferente de José Sócrates? A maioria do eleitorado do PSD não gosta de clientelismo, da promiscuidade entre o estado e as empresas privadas. Os socialistas, em José Sócrates, arranjaram o expoente máximo da promiscuidade entre o estado e o sector privado. Estará Pedro Passos Coelho ao abrigo desse clientelismo?

Ao ser eleito pelos militantes do PSD, PPC terá que fazer mais, melhor e diferente: terá que falar para fora do partido se quiser também ser eleito Primeiro-ministro, e terá que demonstrar através de uma forma consistente e séria de fazer política - e descolando dos exageros de "imagem" de que abusa o actual Primeiro-ministro, que é capaz dessa mudança de que fez título de livro, e de que é, não só uma alternativa credível ao socialismo e a José Sócrates, como também uma alternativa sólida a Paulo Portas, em quem tantos eleitores tradicionais do PSD já dizem que votarão. Não acredito que seja com PPC que o PSD fará a diferença.


27.3.10

Velas 21

Hoje

Manuela Ferreira Leite

Faço minhas estas palavras de André Abrantes Amaral no Insurgente,


E até digo mais. Havemos de sentir a falta da sua forma pouco complacente de fazer política, da sua insistência em não se deixar maquilhar pelo marketing político, e da sua frontalidade pouco simpática, mas certeira. Entramos numa nova era em que a imagem impera sobre a substância, em que as ideias se moldam conforme as causas que se decidem abraçar, e os discursos se fabricam de acordo com o efeito que se pretenda causar e que tenha sido previamente estabelecido. Nem sempre estive de acordo com ela, mas mereceu a minha consideração e respeito.

E até digo ainda mais. Estamos perante uma nova fase na política portuguesa. José Sócrates, Pedro Passos Coelho, Paulo Portas, Francisco Louçã, são políticos feitos do mesmo barro. Sobra Jerónimo de Sousa, um último reduto de franqueza, o único líder que ainda consegue ser razoavelmente genuino e igual a si próprio. Todos os outros parecem sub-produtos embora, para ser justa, deva mencionar que José Sócrates se destaca pela falta de qualidade intrínseca, pelo excesso de plasticidade formal, e pela constância da inconsistência política.

26.3.10

Dando Excessivamente Sobre o Mar 51

William Trost Richards (1833–1905)
Purgatory Cliff

24.3.10

Bingo!

Hoje fiz um telefonema a pedir assistência técnica. Depois de expor o meu problema, a senhora que me atendeu perguntou com o profissionalismo e segurança de quem sabe como resolver as questões e de quem não tem medo de palavras esdrúxulas: “quer que fáçamos a assistência em casa?”, reprimi o meu instinto de explicar os conjuntivos à senhora - estes fáçamos e estes póssamos, que ameaçam espalhar-se desapiedadamente, são mesmo duros de ouvir, e nem o corrector ortográfico gosta deles - e disse que sim. Com a acrescida segurança de quem repete vezes sem conta estas frases e por isso está em território familiar, ela conclui: “há-dem contactá-la para marcar o dia e a hora”. Claramente eu estava em território hostil, balbuciei um obrigada (nesta altura já não me passava pela cabeça explicar-lhe a conjugação do verbo haver), desliguei. Um momento depois pensei afinal na minha sorte: estatisticamente falando, deve ser raro ouvir estas duas preciosidades em menos de dez segundos.

Para além da falta de vergonha que parece ter contagiado todos os membros deste executivo, estas frases

que se atiram ao ar (como o barro que se atira à parede a ver se cola) têm sempre um ar comicieiro e são a face desse optimismo ficcional que nos tentam vender há década e meia. Esta gente não é séria e querem que acreditemos que ao fim deste tempo todo ainda não perceberam o que se passa.


23.3.10

Pudera! Os “mais ricos” não só descontam mais para o IRS porque ganham mais, como descontam num escalão superior, isto é, por cada euro ganho pagam mais IRS do que os que descontam num escalão inferior. Isto é mesmo conversa mole para encher chouriços e ludibriar os eleitores. Nunca o Ministro das Finanças, ou o Primeiro-ministro sempre pronto a encher a boca, e desgastar a nossa tolerância, com afirmações do género “os mais ricos é que pagam a crise”, explicaram de forma inequívoca o conceito de “mais ricos”. Gostava de saber a partir de que vencimento as pessoas passam a ser consideradas por este governo, e para efeitos de “pagar a crise”, “mais ricas”. Afirmações como esta - engendradas nos “think tanks” comunicacionais - populistas, pouco rigorosas (mentirosas tantas vezes), e feitas com o intuito de atirar areia para os olhos, são a marca deste governo. Era tão bom que não fossem também marca de futuros governos.

21.3.10

Em Flor 25


Pesadelo


Perante este pedaço de retórica política, em que se sente a densidade do pensamento (gosto especialmente da parte em que diz usar a sua inteligência emocional), o latejar de uma ideia, a clareza de conceitos, o emergir de uma visão, a ousadia de um combate politico, a sede de justiça, a maturidade democrática e o profundo respeito pela liberdade, envolvidos na mais aprimorada linguagem, sou impelida a ler o que se segue.

Patético. O problema começa quando acordar e perceber que as opções políticas poderão ficar resumidas a José Sócrates ou a Passos Coelho, como num mau guião de ficção plástica. Toda uma outra dimensão de fazer política se abre para a qual não sei se estou preparada.

19.3.10

Piet Mondrian (1872-1944)
Composition in Brown and Grey


18.3.10


Perante uma situação similar, a reacção do PS e a reacção da Igreja Católica. Mas isso não interessa para nada, não é uma causa fracturante e, como diz Helena Matos, “referir o Casa Pia hoje, em Portugal, dá direito a quase passar por lunático”. Infelizmente as coisas são como são.

17.3.10

Da Clareza

A clareza de Pedro Passos Coelho, na entrevista a Judite de Sousa hoje na RTP, (que pode ser vista aqui) surpreende-me pois é sobretudo condicional: tem normalmente um “se” (ou equivalente) que a precede. Ora uma premissa condicional do tipo: “de cada vez que concordar com ..., então votarei a favor”; ou “estarei de acordo se..., mas se não...”; ou “quando for do interesse de..., eu concordarei com...”; dá, de imediato, incerteza à frase que nunca poderá ser clara. A clareza traduz-se através de afirmações simples, sem condições, nem condicionantes, nem contradições. Este é um péssimo hábito de PPC, mas acredito que à força de repetir que é claro as pessoas comecem a acreditar que o é. Deve ser mais uma dessas técnicas comunicacionais das agências de marketing político que tornam os discursos dos políticos sempre iguais e os fazem repetir vezes sem conta a mesma frase. Tal como José Sócrates que espalha optimismo, (PEC? Aumento impostos? Nã...) Hoje foi a vez do seu "plano tecnológico" e de uma visita a uma "empresas de sucesso". Uma coreografia e um script já estafados.

Passos Coelho segue-lhe as pegadas e repete as frases e os temas (exemplo: o Estado não devia ser empresário, quantas vezes ouvi isto nos últimos dias?). Mesmo tendo parecido, como tem sido já hábito ultimamente, calmo e seguro, e mesmo tendo sido nalgumas matérias afirmativo, a verdade é que, na maioria das questões, sobretudo de índole mais marcadamente política, foi tão opaco e sinuoso como é seu hábito. Pressentimos assim o seu "vazio".

Em Flor 24

Hiroshige
Massaki and the Suijin Grove by the Sumida River

16.3.10



Já não é mau e até é um bom primeiro passo, mas a autoridade na escola (tal como a exigência, a responsabilidade, uma menor carga burocrática para os professores, etc) reforça-se com uma maior autonomia da escola, até para que a "sociedade a reconheça". E, claro uma autonomia das entidades avaliadoras.

15.3.10

O homem tem de ir à bruxa. Não há nada que faça, cujo processo ou documentação não se perca. Não há nada em que se envolva que seja linear e transparente. Nada que lhe diga respeito é facilmente explicado e percebido. Nada, desde o curso e casas, até à compra da TVI pela PT. É mesmo azar.


Crónica Feminina 2


14.3.10

O quê?

Depois admirem-se. José Sócrates deve estar com dificuldade em conter o riso, e com razão. Foi para isto que se fez um congresso? Eu realmente não entendo a vida partidária, mas esta do PSD passa os limites da racionalidade e da razoabilidade.

Manuela Ferreira Leite, e todos os que denunciaram a asfixia democrática (não é, Paulo Rangel?) que se foi impondo na sociedade por influência directa do governo de José Sócrates, devem estar ou siderados ou anormalmente dissonantes. Santana Lopes, mais uma vez, numa “simpática” jogada política, levou a água ao seu moínho, numa altura de campanha interna em que os candidatos evitam grandes polémicas. Mas, pergunto-me, que género de gente é esta (os delegados ao congresso) que votam maioritariamente tais aberrações democráticas? São assim tão facilmente manipulados? E porque é que fico (eu e outros, com certeza) com a sensação que esta proposta de PSL, com o cheiro do rancor, visa um ajuste de contas com José Pacheco Pereira?

Em Flor 23

Finalmente!

11.3.10

Do "Bullying"

Entre as autoridades que “palitam os dentes” (e são a imagem da Autoridade no país), e as “comissões interdisciplinares”, o “bullying” entra para a agenda mediática. Por um lado uma velha tradição do: se apanhares, bate com mais força, aguenta, não faças queixinhas e aprende a ser homem (há também uma versão feminina mais insistente no “aguenta”) pois é assim que se forja o carácter; e por outro lado a nova postura proteccionistas dos pais de filhos hiper desejados e planeados, “ai Jesus, que fizeram mal ao meu menino” e que leva os ditos pais dos ditos filhos hiper desejados, planeados, e agora tiranos, à escola em tom de ameaça ao mínimo desagrado ou empurrão que aconteça à criança que é, de tanto ser desejada e caprichada, incapaz de gerir a contrariedade e que entra logo em “descompensação”. Uma coisa é certa: hoje ser escola é difícil: não há tempo para olhar para os alunos com a atenção merecida quer na sala de aula quer no recreio, onde ninguém vê com olhos de ver. Na sala de aula o professor tem pouca autoridade e muita burocracia; no recreio, onde depressa vêm à tona os comportamentos mais problemáticos há escassez de pessoal qualificado a tomar conta das crianças. Este “tomar conta” deveria pressupor um olhar atento, um detectar de padrões comportamentais diferentes, uma intervenção mais clara, firme e segura no caso de confirmação desses padrões de comportamentos violentos e abusivos. Na escola fecham-se os olhos, ninguém do lado dos adultos tem essa vontade de firmeza e segurança: todos temem as consequências – em burocracia e em contestação pelos pares e pelos pais - de “contrariar” os alunos, de denunciar violências, de impor uma disciplina firme, mas justa. Ninguém já deve saber o que isso é, pois os teóricos da pedagogia e da psicologia que é dada à força aos professores encontram sempre uma explicação e justificação desculpabilizantes para a violência de uns e de outros, fica de fora a vítima que vê desvalorizada uma queixa real. Venham então as comissões multidisciplinares, serão um bom pretexto para criar mais um organismo público: um “Observatório” para violência nas escolas. Se não fosse trágico, apetecia rir. O bullying é só mais uma face da enorme violência e indigência do quotidiano do mundo em que estamos, e em que também o respeito que o outro merece é secundarizado face a proveitos e satisfações mais imediatos.

Là-bas, Je Ne Sais Pas Où... 6

Pieter Neeffs the Elder (séc. XVII)
Interior of a Gothic Church


Tolerância a Zero

A entrevista de Miguel Sousa Tavares a José Sócrates, em que o primeiro se preparou muito mal, e o segundo persistiu na sua já batida linha de recusa de ver o real e no abundante uso de má retórica optimista, e o anúncio do PEC, cujos pressupostos vêm desdizer o cenário que nos foi pintado pelo PS durante todo o ano de 2009 e durante as sucessivas campanhas eleitorais, e cujas medidas anunciadas para combate ao deficit são diametralmente opostas prometido pelo PS e por José Sócrates durante a campanha eleitoral para combater a crise, zeraram por completo o nível – já de si milionesimal – de tolerância ao Primeiro-ministro e ao seu governo, nomeadamente a Teixeira dos Santos que sempre considerei, durante a legislatura anterior, a pequeníssima, mas única, âncora de realidade no governo. Desde aí que não consigo vê-lo, nem vê-los, ouvi-lo, nem ouvi-los. Aguardo com expectativa, mas já sem interesse pela campanha, o desenrolar da novela PSD sem saber se ficaremos com a mudança, a ruptura, a força, ou outro qualquer substantivo que entretanto ocorra a alguém. O país, enquanto isso, continua mergulhado em descrédito, mentira e intriga, e a caminhar para o abismo das contas públicas e da contestação social que não tardará em sair à rua. O país continua entregue nas mãos de governantes e políticos desrespeitados e desacreditados, sem um rumo que se perceba e que impulsione algumas das reformas estruturais que urgem (apesar de já urgirem há 10 anos, note-se). Nada consente hoje, a alguns de nós, uma nesga de alento.

8.3.10

No seu comentário acerca das medidas de agravamento fiscal e do adiamento do TGV por dois anos para equilíbrio das contas públicas decididas pelo governo no âmbito do PEC, José Gomes Ferreira (SIC, Primeiro Jornal) pergunta o que diria o governo anterior, nomeadamente o Primeiro-ministro e Ministro das Finanças anteriores, das medidas apresentadas por este governo actual pela voz do Ministro das Finanças.

Ah Manuela Ferreira Leite, tão incompreendida apesar de tão certeira nas parcas e secas palavras que proferia então.

Claro que o eleitorado não gostou, pois prefere mentirosos e optimistas de pacotilha. Já disse, numa sondagem divulgada na passada semana, que votaria novamente em José Sócrates, apesar de acreditar que ele mentiu ao parlamente e que mente. Tanta esquizofrenia num país tão pequeno.


Pirosadas a propósito do Dia da Mulher,

Sobre isto de que se fala aqui: aposto que foi Zeinal Bava e uma equipa sua de secretários e assessores (homens, claro) que, tiveram e tornaram viável esta ideia. É por isso que estes gestos, para além de pirosos, são patéticos e puro marketing. Não é de flores que as mulheres que trabalham precisam é, por exemplo, de creches.

Aquecimento Global

Onde andam este ano os passarinhos a chilrear e as flores a desabrochar?


7.3.10

Cambridge Spies


Cambridge Spies é uma produção da BBC de 2003 sobre a vida dos famosos quatro amigos ingleses que foram espiões ao serviço da União Soviética: Anthony Blunt, Kim Philby, Guy Burgess, e Donald McLean que, especialmente durante a Guerra Fria, traem o seu país fornecendo informação ao KGB, e cuja extensão da verdade das suas vidas (até aí só se sabiam pedaços) deixou o Reino Unido em estado de choque no início da década de 80. Tão difícil que era acreditar que um dos “nossos” (quanto mais quatro) fosse capaz de trair o país. Parece enredo de filme, mas como alguns de nós sabemos, a realidade ultrapassa quase sempre a ficção. Este é um dos casos.

Pensei que ia ver mais espionagem, isto é, mais luz sobre o mundo escuro e cheio de perigo, manipulação, suspeitas, tráfico, duplicidade, traição e jogos que acreditamos ser o mundo da espionagem. Mais idas e vindas, mais fugas, esconderijos, mais segredo e sobretudo mais conflito, com eles próprios, com os seus contactos e com o mundo. Nesse sentido fiquei um pouco desiludida com o tom “light” da série, que pouco mais faz do que dar umas pinceladas em tons luminosos, e se esquecer algum luxo e glamour, às vidas tortuosas destes homens. Tudo parece demasiado fácil: tornar-se espião, tornar-se credível perante os seus compatriotas, merecer confianças de um lado - instituições do RU - e de outro - KGB e Moscovo, que nunca terão confiado totalmente neles - penetrar no MI5 e MI6, passar informação, enganar e viver uma vida aparentemente normal e sem grandes cuidados. Não se percebe bem, por exemplo, o que fizeram os quatro, como cidadãos britânicos e espiões ao serviço de Moscovo, durante a Segunda Guerra Mundial, pois a série é bastante omissa sobre esse período, deixando implícita, mas não convincente, como explicação o facto de Reino Unido e União Soviética terem sido aliados contra Hitler.

A série termina cedo: não mostra o choque cultural e pessoal que terá sido a chegada a Moscovo de três deles (McLean, Burgess e Philby) e a sua adaptação, ou não, a um estilo de vida tão diferente daquela que eles conheciam, amavam e da qual eram “elite” e privilegiados. Não há também referência à vida de Blunt que permaneceu em Inglaterra onde fez uma vida ligada à História da Arte, e a quem foi dada uma condecoração (knighthood) que mais tarde, e ao conhecer-se toda a história de espionagem que chocou a Grã-Bretanha e que o(s) expôs, lhe foi retirada pela Rainha por influência de Margaret Thatcher.

Sobra por isso aquilo que a BBC sabe fazer melhor: o retrato de um período, ou melhor, de vários períodos da vida do século XX na Inglaterra e das suas instituições, nomeadamente a Casa Real e o Foreign Office. Sobra o tratamento das recorrentes questões de classe “us” (Eton, Trinity Colledge Cambridge...) and “them” (por exemplo, os americanos por quem sentem um leve desdém), não no sentido exclusivo de classe social, mas antes num sentido de uma elite social e cultural que está “in charge” do país, ou melhor, das instituições que sustentam o país, que ao contrário dos políticos que vão e vêm, se mantém. Esta questão às vezes parece demasiado explicada, mas talvez os mais jovens necessitem dessa componente explicativa, não faço ideia. Sobra a história de uma amizade que une os quatro homens mas cujo desfecho (da amizade) ficamos sem saber, apesar da amargura que se adivinha; sobram pequenos e deliciosos retratos da vida despreocupada e privilegiada na sociedade inglesa; sobra alguma intriga diplomática; sobra o peso, que se carrega, às vezes já sem saber porquê (coisa que eles regularmente tentam lembrar), de uma decisão tomada na juventude e que vincula inexoravelmente para a vida. Sobram inúmeros momentos do melhor humor: a greve dos empregados de mesa em Trinity Colledge, a entrevista de Burgess para trabalhar na BBC, entre outros. Sobra uma representação sólida e boas actuações, destacando-se sobretudo dois excelentes actores: Tom Hollander e Toby Stephens respectivamente nos papeis de Guy Burgess e de Kim Philby.

Finalmente, e como não poderia deixar de ser a abrir e a concluir a série, sobra o hino à “englishness”, ou não fossem eles uma parte inquestionável do “us”. Ontem e hoje, sempre Jerusalém de William Blake
.
Há uma cena magistral (a melhor) no filme “An Education. (Atenção, spoiler). Penso na cena da revelação em que Jenny, percebendo-se enganada e traída, pede a David enfática, mas dignamente, para que ele não a obrigue a ter de dizer a verdade aos seus (dela) pai e pois ele deve-lhe, a si e a eles, a verdade da sua (dele) boca. Dá-lhe dois minutos e sem contemplações ela sai do carro e entra em casa de cabeça erguida com a maquilhagem dos olhos desfeita pelas lágrimas. Ele fica no carro, espera, bebe um golo, espera. Ela espera, os seus pais esperam. Finalmente ela ouve o carro dele a arrancar e partir. Ela fica só perante o olhar aturdido dos pais. Senti logo que só uma mulher poderia ter concebido e feito uma cena destas carregada de significado ou significados, bem como de história de história. Lembrei-me desta cena depois de ter lido este texto de Teresa Ribeiro em que fala actual presença das mulheres a fazer cinema.


4.3.10

Amanhecer 24

Hoje,

finalmente vejo alguma, côr no céu da manhã. Se Kafka cá estivesse, (ou Cronenberg) não teria metamorfoseado a sua personagem em insecto. Estou certa que seria um anfíbio numa casa húmida à beira rio. Parece que amanhã volta a chuva. Vou ali comprar umas barbatanas e volto já.

Hoje há greve da Função Pública contra o congelamento de salários, penalização das pensões e contra a precariedade laboral. Num cenário de crise, em que a dívida pública cresce e o deficit atingiu, facto reconhecido finalmente pelo Ministro das Finanças, um nível elevado, em que todos os dias empresas, privadas, claro, abrem falência ou fecham e em que todos os dias mais pessoas ficam sem emprego engrossando as estatísticas do desemprego, parece-me difícil de perceber o que move os sindicatos para a convocação de uma greve. A crise atinge todos (através de congelamentos salariais, agravamento de impostos, etc) e precariedade é um dado na sociedade europeia de hoje, e os funcionários públicos têm que se habituar a esse conceito também. Os sindicatos para serem credíveis e contribuírem para uma maior justiça social e laboral, e para o desenvolvimento do nosso pais, têm que mudar essa forma dicotómica (marxista?) “bons e maus” ou “patrões e trabalhadores” ou “exploradores e explorados” de olhar para o país.

Não é por o governo ser do PS de José Sócrates, e por eu não gostar dele como Primeiro-ministro, que concordo com qualquer greve. Este não é momento para greves. Esta crise é resultado das opções de quem nos tem governado, e quem nos tem governado tem sido sempre sufragado em eleições. Sem eleições, não há governos, e para que alguém governe tem primeiro que ganhar eleições. Por isso é que eu gosto de discursos realistas e pouca conversa mole antes de eleições. Sobretudo nada de optimismos plásticos. Mas não tenho tido sorte nenhuma. Não é disso que os eleitores gostam.

3.3.10

Lady Chatterley

Diz-se aqui, a propósito do aniversário (octogésimo) da morte de D. H. Lawrence (a Serpente Emplumada, por exemplo, marcou a minha forma de ver e sentir o México) que "de qualquer modo, lady Chatterley, hoje, está no poder". Que ela está, está. Mas se é no poder eu já não sei - pensei com os meus botões ontem, logo depois de ler o post. Lembrei até a violência doméstica e no que ela “dá” em poder a todas as lady Chatterleys que eventualmente estejam ou sejam cada mulher. O Francisco José Viegas é um optimista, ou melhor, um ficcionista.

Ainda ontem, mas ao fim do dia, enchi o tanque do carro na Galp e paguei mostrando o meu cartão “Fast Woman” (um nome que poderia ser, neste nosso mundo acelerado, um ersatz de Lady Chatterley). Tenho destes cartões que esqueço de converter em bens - que muitas vezes não preciso, por isso ainda bem – e que até hoje só serviram (o da BP, não o da Galp) para comprar bilhetes para o Rock in Rio, (onde nunca fui, note-se). Voltando ao pagamento: perguntaram-se se queria comprar um chocolate que dava pontos extra para o cartão. Não obrigada. Ofereceram-me o jornal i, sim obrigada; e o senhor da caixa perguntou-me se queria a Happy. Não obrigada. Mas é oferta, insistiu. Oferta? Sim, para as senhoras que gastem acima de um determinado montante. Embora cabendo nas duas categorias, recusei novamente porque sei como é a Happy, sei que mesmo que a abra não a lerei, e tenho pouca vontade de trazer tralha para casa. Mas esta é a última e a senhora vai gostar, insistiu o senhor da caixa enquanto me passava a Happy para as mãos.


Cheguei a casa e olhei para a capa. Entre outros assuntos a abordar no interior da revista, são anunciados estes dois interessantes temas: “SEXO: Inquérito revela o que elas querem” e ao lado, “QUER SER INFIEL? Site propõe-se a arranjar-lhe um amante”. Pensei novamente na lady Chatterley de Francisco José Viegas e na ilusão de que ela, hoje, está no poder. Não está, a realidade é outra: tem muitas vezes mais a ver com trabalho árduo e pensões alimentares para filhos que nunca são pagas a horas, quando o são. Não se deixe enganar pelas Happys e Cosmopolitans que se publicam e que enchem de ideias chatterleyanas raparigas e mulheres da cidade e do subúrbio.

Já Estou Farta de Tanta Chuva

... e farta de tanto vento.

Sábado, 27-02


Duas Visitas Diárias (ou quase), Duas Referências

Comecei a ler o Blasfémias quando ele surgiu e lembro-me de como gostava de ler opiniões avisadas, mas com alguma frescura e irreverência que vinha da aparente (pois não sabia sequer quem eram os autores do blogue nem nunca tinha ouvido falar deles) ausência de peias ao “sistema”, sobre a omnipresença e o excessivo peso do Estado na nossa economia e sobre o intransigente respeito pela liberdade individual. O blogue cheirava a Norte (norte do país, claro) e mostrava uma face oriunda das velhas tradições liberais da cidade Invicta. Hoje, os seus colaboradores são já quase “estrelas”, alguns até já estão no comentário político “oficial” dos meios de comunicação tradicionais. As adesões mais tardias, quase todas sulistas e de pessoas com curriculum, quer noutros blogues (jcd), quer na política (Paulo Morais), quer no jornalismo (Helena Matos e José Manuel Fernandes), têm contribuído para a enorme visibilidade e crescente influência do Blasfémias. Por esse ar fresco opinativo e por essa irreverência está de parabéns o Blasfémias.

O Insurgente, que comecei também a ler quando surgiu, facilitando a minha tarefa de visitar diferentes blogues "liberais", e cuja visão de uma economia mais livre e autónoma do estado vinha também de encontro à minha, é um blogue sólido, uma âncora do pensamento liberal blogosférico, onde se respira um ar sobretudo académico. Não fogem à polémica, e usam muitas vezes como armas, para além dos seus sólidos e pensados argumentos, referências (que podem ser mesmo excertos de textos) a autores que influenciem o seu pensamento ou estudo, a bem de uma política económica mais liberal. Parabéns pelos cinco anos que completaram.


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