“… he resolved never again to kiss earth for any god or man. This decision, however, made a hole in him, a vacancy…” Salman Rushdie in Midnight’s Children.
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13.1.07

Dilemas morais

Do mesmo modo se espera que os defensores do "não" considerem existir outro tipo de dilemas morais tão genuínos como os suscitados pela questão da "vida". Uma gravidez não desejada, - e pode ser não desejada por inúmeros motivos - , é também profundamente perturbadora (pode também "matar" em vida) e suscita questões morais que não são menores do que aquelas que se levantam à volta da "vida". Reconhecer uma idêntica valoração moral quer aos motivos da decisão do "sim" quer do "não", é o único ponto de partida para um debate sério e não relativista.

Depois de ter lido esta nota de JPP, não deixo de querer fazer um breve comentário. É precisamente porque a questão do aborto levanta “outro tipo de dilemas morais” que é tão polémica, fracturante, funcionando como uma espécie de caixa de Pandora de onde vão saindo cada vez mais questões, quer do foro íntimo quer do foro social, morais e éticas, financeiras e políticas. O aborto toca na “vida”, e na “vida” cabe tudo. Discutir o aborto é complexo e eu creio que a abordagem “less is more” é provavelmente aquela que evita extremismos, demagogias fáceis, certezas absolutas, slogans datados ou arrogâncias morais. A parte que me levanta dúvidas prende-se com o “tipo de dilemas morais” que poderão determinar uma opção de aborto. Eu não duvido que sejam genuínos, legítimos, naturais e normais (num sentido estatístico de normalidade), o que questiono é se, na valoração moral estas questões terão o mesmo peso que a “vida”. Primeiro porque quando falamos na questão da “vida” sabemos do que falamos, e quando falamos de “outro tipo de dilemas morais”, não sabemos do que falamos, tornando-se mais difícil essa valoração.

A lei actual contempla alguns conhecidos dilemas morais: violação, saúde da mãe (de forma muito abrangente) e mal formação do feto. Existirão muitos mais, sobretudo no foro íntimo de cada ser humano. Mas como pode ser feita essa valoração? Deve a sociedade fazer uma lei que acautele, esses “outro tipo de dilemas morais”, e só durante as primeiras dez semanas, em detrimento de um valor que se considera maior e que é a “vida”?

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