Vi recentemente a primeira e a segunda temporada de “The Tudors”, que se centra no reinado de Henrique VIII, não especialmente no facto de ter tido sete mulheres, mas nos restantes aspectos do seu conturbadíssimo e marcante reinado. A série é feita ao estilo de “Roma”, ambientes e adereços muito cuidados, mas alguma crueza (boldness). Tem também um acelerado ritmo narrativo, muita intriga política, muita intriga em geral, religião, sexo e violência quanto baste. Gostei particularmente da forma como caracterizaram algumas personagens: a Rainha Catarina de Aragão e algumas personagens ligadas à Igreja Católica: o Cardeal Wolsey, o Bispo Fisher e Thomas More (estes dois últimos mártires canonizados). Nenhuma destas personagens é banal ou estereotipada, e têm uma vida dura feita de opções difíceis pois são movidas por convicções morais e por uma força de carácter hoje quase incompreensíveis e ainda menos valorizadas, que as afasta para sempre dos confortos de uma vida. Em nome de convicções inabaláveis e de uma fé absoluta escolhem o caminho difícil para elas e para os seres que lhes são queridos.
Falo em fé absoluta, pois a fé dos homens (seja em que for) é também feita de medo, de hesitações, de compromissos, de dúvida. O caso de Thomas More é interessante pois ele, como advogado que era e como amigo leal do rei que era, tentou de várias formas ser flexível para evitar dissabores com o rei. Ele não queria ser mártir, não queria morrer, não queria deixar a família desamparada e usou essa flexibilidade nomeadamente na decisão de nunca falar mal do seu rei, nem de nunca condenar o seu casamento com Ana Bolena. Demitiu-se do cargo de Chanceler quando não concordou com as decisões políticas e retirou-se da vida pública para evitar demasiada exposição. Ao contrário do Bispo John Fisher que foi sempre mais frontal, More foi flexível e usou todas as armas que tinha (nomeadamente a retórica) para adiar e evitar o conflito aberto com o seu rei. Mas, claro, o momento de assinar o Act of Supremacy que proclamava o rei como chefe da Igreja em Inglaterra chegou, e perante esta opção a capacidade de flexibilidade de Thomas More esgotou-se pois tinha um claro limite que era o da sua consciência, das suas convicções e da sua fé. Este caso é interessante por causa deste momento em que ele já não pode ir mais além, deste limite que ele se recusa a ultrapassar, pois fazendo-o deixa de ser ele, põe em causa a sua integridade violando-se a si próprio, violando a sua consciência e renegando as suas convicções. Esse limite moral ele conheceu-o bem, e nada nem ninguém o fez demover da sua decisão.
(Continua)
.
Falo em fé absoluta, pois a fé dos homens (seja em que for) é também feita de medo, de hesitações, de compromissos, de dúvida. O caso de Thomas More é interessante pois ele, como advogado que era e como amigo leal do rei que era, tentou de várias formas ser flexível para evitar dissabores com o rei. Ele não queria ser mártir, não queria morrer, não queria deixar a família desamparada e usou essa flexibilidade nomeadamente na decisão de nunca falar mal do seu rei, nem de nunca condenar o seu casamento com Ana Bolena. Demitiu-se do cargo de Chanceler quando não concordou com as decisões políticas e retirou-se da vida pública para evitar demasiada exposição. Ao contrário do Bispo John Fisher que foi sempre mais frontal, More foi flexível e usou todas as armas que tinha (nomeadamente a retórica) para adiar e evitar o conflito aberto com o seu rei. Mas, claro, o momento de assinar o Act of Supremacy que proclamava o rei como chefe da Igreja em Inglaterra chegou, e perante esta opção a capacidade de flexibilidade de Thomas More esgotou-se pois tinha um claro limite que era o da sua consciência, das suas convicções e da sua fé. Este caso é interessante por causa deste momento em que ele já não pode ir mais além, deste limite que ele se recusa a ultrapassar, pois fazendo-o deixa de ser ele, põe em causa a sua integridade violando-se a si próprio, violando a sua consciência e renegando as suas convicções. Esse limite moral ele conheceu-o bem, e nada nem ninguém o fez demover da sua decisão.
(Continua)
.