Se em matéria de símbolos e prática religiosa se tem como objectivo um higiénico vazio, outras áreas nomeadamente relacionadas com o pensar, o questionar, o criticar, o analisar, parecem também estar a sucumbir à mesma redução ao grau zero. A perspectiva que começa a desenhar-se de se acabar com todos os partidos políticos incapazes de fazer prova de terem nos seus registos mais de 5000 militantes, ou o “não” ao referendo sobre a questão europeia são algumas ilustrações desta onda redutora e de terraplanagem da sociedade. Fica um vazio ideológico e de debate, em que a diferenciação não é bem-vinda começando por isso a ser metodicamente eliminada deixando um espaço amplo ao centrão que alimenta o regime para que, de acordo com o soprar dos ventos, este se encha e se tinja de algumas cores para dar uma patine de pensamento, reflexão e de pluralidade. Ambiente, aquecimento global, casamentos gay dão um ar de esquerda, ex-combatentes e liberalizações de alguns sectores de actividade normalmente reservadas ao estado, reforço de autoridade dão o ar de direita, e o ar moderno e actual de quem está na linha da frente é dado com os temas das novas tecnologias ou pelas preocupações com a vida saudável. Está tudo previsto.
Assim nasce uma sociedade grau zero: feita de indivíduos bi-dimensionais, lisos e brilhantes como o aço polido das belas e modernas cozinhas onde impera a higienização e as facas de cabos de cores diferentes, ou gentes polidas de acabamento cuidado e de design perfeito como os sapatos Prada, ou então luminosas, cintilantes, rápidas e eficientes como as luzes dos computadores e de qualquer gadget moderno filho das novas tecnologias. Tudo sem debate, tudo sem colesterol, tudo muito liso, tudo muito igual, tudo muito vazio. Aldous Huxley não fez melhor.