O exercício de um cargo político, ou de outro cargo público com poder e elevada capacidade de decisão, deveria ter por base a noção de serviço. Num mundo ideal tem, e num outro mundo menos imediatista em que o carácter se forma com base em valores pouco visíveis e não consumíveis, de vez em quando também tem. Complementando essa disponibilidade de serviço, deve estar a competência e a integridade. Todas as outras possíveis ou desejáveis características ao lado destas são, em última análise, irrisórias e servem sobretudo para encher jornais. A ambição, a visibilidade, a atracção pelo poder ou a ilusão de que se exerce esse poder, o estar lá nos centros de decisão ou a ilusão de que realmente se decide, o querer-se e saber-se influente, a certeza de que hoje um cargo político é um degrau seguro para um futuro confortável num cargo público ou numa empresa pública, semi-pública ou privada dessas que vivem na promiscuidade que é o nosso regime, são hoje os principais factores motivacionais de quem abraça um cargo de serviço público. Mesmo quando o discurso é sobre a vontade de servir o país os actos, um a um, desmentem-no.
Esta semana que passou ilustrou esta ausência da noção de serviço de forma dolorosamente visível e não deixou também dúvidas quanto à competência e à integridade. Um momento verdadeiramente confrangedor esse em que vimos Mário Lino sentado ao lado de José Sócrates, (ou deverei dizer: em que vimos José Sócrates sentado ainda ao lado de Mário Lino?) enquanto o PM anunciava a decisão de construir o aeroporto em Alcochete... Tal momento, já por demais analisado e dissecado, em que se destaca a constante desfaçatez do PM e a passividade amestrada do ministro, deixou-nos boquiabertos e hoje continuamos a ter dificuldade em acreditar que se tenha mesmo passado. O mesmo aconteceu quando fomos confrontados, já não só com a possibilidade da administração da CGD poder ir para o BCP e Armando Vara com ela, mas com o facto de este último ter pedido licença sem vencimento à CGD para não perder o vínculo laboral que o prende à instituição pública.