“… he resolved never again to kiss earth for any god or man. This decision, however, made a hole in him, a vacancy…” Salman Rushdie in Midnight’s Children.
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29.2.08

Pronúncia do Norte 2

Hoje ao entrar numa sala ouvi duas mulheres novas a falar. Algo estranho e familiar: o sotaque tão deslocado no local, mas tão conhecido. Disse, sem as conhecer, que parecia que estava na minha terra. No Porto? Sim, no Porto. Ah, explicaram elas, já cá estamos há três anos. Uma há mais tempo, outra há menos, a trabalhar. O mercado de trabalho lá está péssimo, diziam. Eu gosto do clima de cá, mas se pudesse voltava para lá, dizia uma, eu já não sei, dizia a outra. Ouvia-as e pensava no que sempre ouço quando vou ao Porto ou quando alguém do Porto vem cá: que tudo está mudado, que as empresas não sobrevivem, que o tecido empresarial é fraquíssimo, que o país está cada vez mais centralizado, que o Porto empobrece a olhos vistos, que o Norte já não é o que era, que quem é ambicioso tem que vir para Lisboa, que cada vez mais tudo se decide em Lisboa, que Lisboa enriquece. Enfim, um sem fim de lamentações. Se é verdade que vejo muita mudança no Porto, muitas certezas abaladas, muitas vidas transformadas, famílias instabilizadas, também vejo em alguns locais, lojas das mais caras do país sempre com gente e um parque automóvel de fazer inveja. Fenómeno pontual, e muito localizado? Provavelmente. Mas lamento esta tristeza das pessoas no Porto que está tão mais arranjado e mais convidativo.

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