“… he resolved never again to kiss earth for any god or man. This decision, however, made a hole in him, a vacancy…” Salman Rushdie in Midnight’s Children.
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21.7.07

A Geração Harry Potter 2

Falei num post anterior do facto de uma franja da sociedade crescer com a saga de Harry Potter como principal referência literária, ou mesmo, em muitos casos, a única que terão. Confesso que prezo pouco, e venero nada, a tão valorizada literatura juvenil que enche hoje os manuais escolares de língua portuguesa e as prateleiras das secções “juvenis” das livrarias. Eu aprendi a língua portuguesa com os autores consagrados da língua e não percebo porque é que hoje os textos dos livros são todos “juvenis” na melhor das hipóteses, e imbecilo-infantis, com um tom moral politicamente correcto (o tom moral dos manuais antigos era de uma ingenuidade desarmante) como norma. Que é que se pode esperar de toda uma geração que engole a série “Aventura”, que parece não ter fim nunca (os editores lá sabem), dos 9 aos 14 anos? Ou das variantes infinitas de “Diários de...” que nada dizem que não seja mais do mesmo, forçando os “jovens” a fecharem-se ainda mais nos seus já de si grandes umbigos, mundos de bué, sms desenfreadas, respostas tortas e insolentes a tudo e todos e exigências múltiplas. Não quero dizer que os livros digam ou ensinem coisas “más”, eles até têm sempre uma óbvia componente paternalista e pedagógica, o que digo é que não ensinam nada de novo, não abrem horizontes - viver aventuras em cada canto de Portugal e em mais meia dúzia de países não é abrir horizontes - não ensinam nada que obrigue a pensar, não aguçam curiosidade nem engenho, não desenvolvem o espírito crítico, não ajudam a formar carácter.

Neste cenário a saga Harry Potter é ouro sobre azul pois está a anos luz da banalidade, previsibilidade e do mundo pequenino das gémeas da série “Aventura”, ou das Sofias e afins que escrevem o seu “Diário”, mas no entanto também não basta. Para crescer e amadurecer outras obras e outras referências são importantes, sobretudo é importante deixar o mundo da literatura “juvenil” e abrir os olhos para a literatura tout court. A nossa sociedade, ilustrada pela oferta de que dispomos, aposta muito em produtos jovens, que vão desde a literatura ao crédito – o crédito jovem hoje já vai até depois dos trinta anos. Parece que vivemos num mundo em que se adia o mais que se pode o crescimento, o amadurecimento, um mundo que se recusa a ser adulto.

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