“… he resolved never again to kiss earth for any god or man. This decision, however, made a hole in him, a vacancy…” Salman Rushdie in Midnight’s Children.
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23.7.07

O vazio

Paris Hilton, a jovem loira que tão bem ilustra o valor da celebridade hoje sendo célebre por ser célebre, esse ícone cor-de-rosa do nada, é uma das figuras mais mediáticas e a mais escrutinada e seguida do planeta. Revistas, jornais, televisões, internet e livros: nenhum meio escapa ao poder desta loira que todos querem conhecer. Longe vão os tempos em que se queriam conhecer as pessoas pelos seus feitos, pelas suas obras, pelas suas ideias ou até pela sua personalidade. Agora os parâmetros são outros, o que talvez ajude a explicar o fenómeno de ascensão à celebridade de pessoas tão improváveis. O mesmo se passa no meio político e Portugal não é excepção.

Os líderes políticos que se impõem e se reconhecem facilmente quer pela força da sua visão e projecto, quer pelas suas convicções e ideias, ou mesmo pelas suas personalidades complexas e tantas vezes polémicas, trazem com eles uma grandeza de quem viu, sabe, conhece e quer. Escapam às estratégias de marketing que coreografam posturas e gestos, que impõem slogans, tons de voz e tiques, e os preparam para serem um produto. Eles próprios são o seu marketing, a estratégia e a táctica e detêm uma autoridade própria. Parece que estamos em período de carência deste tipo de líderes, ou porque eles já não existem ou não querem, ou porque a própria sociedade evoluiu e já não os quer e prefere pessoas, que, tal como Paris Hilton, se fabricam e moldam para responder às expectativas mais simples, básicas e demagógicas. Hoje olhamos para Portugal, e mesmo para o mundo e vemos líderes políticos tépidos, que parecem ter saído de uma prateleira de supermercado depois do banho de marketing que os torna apetecíveis e facilmente consumíveis, apesar do sentimento de vazio e o som do oco. Têm um bom rótulo, mas a essência parece pobre, o conhecimento fraco e o talento discutível. Estudam Inglês Técnico em vez de Shakespeare ou Dickens e nem mesmo Bill Clinton, um homem com inegáveis talentos e capacidades, escapou à confrangedora banalidade ao consentir falar da sua vida íntima perante as câmaras de televisão; primeiro mentindo e depois pedindo desculpas ao país. Estamos no mundo do parece. Parece que é determinado(a), parece que sabe o que faz, parece ambicioso, parece que conhece os dossiers, parece informado.

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