Esta mania de fazer entrevistas a políticos em que à viva força se tenta encontrar a “outra face” deles, o seu “lado escondido”, deve ter um propósito qualquer que, para além do básico voyerismo à maneira do reality-show que parece dar audiências, me escapa e cujo objectivo político, por mais que tente, não entendo. Mas deve ser problema meu. Falo dos programas da SIC que passaram esta semana às 19h. Não vi um programa sobre Manuela Ferreira Leite, nem sei se ainda o vão passar, ou se não o fizeram.
Pergunto-me se é interessante ou proveitoso saber que os nossos políticos choram todos (surpresa!) nomeadamente a ver ver alguns filmes românticos, José Sócrates gosta de finais felizes (o optimismo sempre em alta), Jerónimo de Sousa (que lembrou a comoção de E Tudo O Vento Levou) também confessou preferir finais felizas e destacou a ternura e as qualidades humanas que triunfam nalguns deles. Louçã – mais à vontade nos transportes públicos do que na sua casa - considerou o E.T. um dos filmes românticos do nosso tempo. Também me questiono sobre a utilidade de ouvir uma prelecção estéril e oca de José Sócrates sobre o humor “fino” e outra sobre poesia, ouvindo-o falar do seu deleite a ler a Ode à Noite (palavras dele que eu não sei bem a que se refere) de Ricardo Reis e como seria interessante instituir (ou obrigar, não lembro a palavra, mas a ideia era esta) nas escolas, presumo, uma hora de leitura diária de poesia. Nem comento a ideia de “obrigar” que isso é uma segunda natureza para José Sócrates, mas penso só o quão divertido isso seria em alunos que só no 9º ano de Português têm o primeiro contacto formal com os clássicos da nossa literatura.
Como se isto não bastasse vimos em pormenor o sashimi e sushi que Paulo Portas – que parecia bem à vontade neste registo - ia comer e cujo paradeiro o preocupou e ficamos a conhecer as propriedades terapêuticas (palavras minhas) que o design de interiores tem para ele, nomeadamente quando se afastou da política. Churchill, Corto Maltese e Sharon Stone são personagens marcantes para ele. A ideia da entrevistadora de interrogar os netos de Jerónimo de Sousa, sobretudo o mais velho, sobre se gosta de ver o avô na televisão, se é amigo do avô, se gosta do avô, se lhe diz que o gosta de ver na televisão, porque é que é amigo dele, e porque é que gosta dele, não lembra o diabo. Para quê tanta pergunta e insistência a uma criança tão nova? Que interesse pode isso ter? Poderia citar outros exemplos de banalidade disfarçada de ver “como nunca vimos” os nossos políticos, mas creio que estes chegam.
A concepção do programa é desinteressante, sobretudo em época eleitoral onde há pouca inocência e muito combate político e nada se faz ou diz sem ser medido e pesado; para além disso a entrevistadora não ajudou: deu pouco espaço aos sujeitos do programa e forçou demasiado a porta da casa (a intimidade) para além de ter adaptado pouco o registo a cada um dos entrevistados, repetindo e insistindo nas mesmas perguntas: parecia obcecada por saber se os políticos choravam, e por saber se eles já tinham excedido os limites de velocidade. Como se isso revelasse algo inédito e como se alguém se surpreendesse. Tudo espremido fica pouco: meia dúzia de lágrimas, que nesta altura mais não são do que de crocodilo.
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