“… he resolved never again to kiss earth for any god or man. This decision, however, made a hole in him, a vacancy…” Salman Rushdie in Midnight’s Children.
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20.2.09


Foto daqui, claro

Um dos temas/posts mais provocatórios de toda a blogosfera é certamente o “A Passagem do Tempo por um Banco no Jardim de St. Amaro”, pela perplexidade que causa, pela irritação, pela incompreensão. Eu própria andava intrigada com aquela “treta” de banco postada vezes demais e que achava uma perda de espaço. Mas como com tudo na vida vamo-nos habituando e a pouco e pouco as coisas vão-se entranhando, e a provocação começa a esboçar-se e a tornar-se nítida.

O banco começa por ser enigmático e a intenção também. Porquê postar com tanta frequência um banco num jardim de Lisboa? A fotografia é demasiado normal e despretensiosa para que possa ser considerada uma obra de arte ou um golpe de génio. Para quê, então? Num segundo momento é a continuidade, a persistência: não é só uma fotografia, é outra e no dia a seguir outra, e mais outra e outra ainda, e sabemos que amanhã veremos outra. Primavera, Verão, Outono e Inverno. Há dois anos, no ano passado, este ano e no próximo. As pessoas fotografadas vêm e vão e o banco fica. As folhas das árvores caem voltam a nascer e o banco permanece. Está lá. Sempre. É símbolo da permanência versus o efémero, da constância versus o impulso, da solidez versus a fragilidade, da indiferença versus a “luta”. Ora este símbolo é contrário ao espírito dos tempos que correm, onde a mudança e a novidade são valorizados, onde as modas se sucedem e as inovações são aguardadas com curiosidade e reverência. Mas a novidade cedo se esgota, depressa passa. O banco no Jardim de St. Amaro, não. O banco, indiferente a quem lá se senta, à idade ou à roupa que veste, indiferente aos governos que nos governam, ao caso Freeport, pactos de regime, casamento entre pessoas do mesmo sexo, ou até à existência de Pedro Passos Coelho, absolutamente indiferente ao facto de ser ou não objecto de fotografia e irritação de quem a vê (fotografia) regularmente “postada”, indiferente à polémica do momento, aos links feitos ou não, às audiências, ou até à sorte de quem o fotografa e de quem “posta” a fotografia, é a grande provocação com que o Abrupto brinda a blogosfera quase diariamente.


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